9 de novembro de 2011

Maria da Mata

Personagem histórica do município de Iúna, conhecida por ter vivido mais de um século, Maria da Mata foi uma das primeiras moradoras do Satírio.

Uma mulher que viveu em condições de pobreza, num tempo em que a raça, a cor da pele e o gênero, eram fatores que determinavam à posição social e a vida do indivíduo, onde raramente a ascensão social acontecia. Vivendo na simplicidade e nas condições pertinentes da sua época, Maria da Mata traçou uma história, que circunda desde a marginalidade social de uma mulher afro-descendente a preservação cultural dos costumes indígenas e africanos. Hoje, essa história de vida é contada por depoimentos orais de parentes e conhecidos, tendo como cenário principal a cidade de Iúna no século XX, década de 40 a 1982.

Maria da Mata morava em Bom Jesus de Itabapoana, quando criança viveu numa grande fazenda da região onde seu pai trabalhou como escravo, porém, ela não foi escrava, nasceu após a Lei do Ventre Livre, lei nº2040, aprovada pelo Senado em 28 de setembro de 1871, que concedeu liberdade aos escravos nascidos no Brasil após a data de promulgação da mesma. Os descendentes de Maria da Mata contam que ela era filha de um negro escravo e de uma índia puri, não foram localizados seus registros de nascimento e óbito.

Os Puris, grupo indígena atualmente considerado extinto, habitavam no século XIX os estados brasileiros do Espírito Santo, Rio de Janeiro e Sudeste de Minas Gerais. Devido à chegada dos portugueses, os puris se dispersaram pelo interior do Brasil. Estes indígenas são mencionados com os seguintes aspectos físicos: baixos ou de estatura mediana, robustos, pescoço curto e grosso, pés largos e dedos grandes, pele macia de cor parda-escura, cabelo comprido liso de cor negra, sem cabelo nas axilas e peito, rosto largo, testa estreita, nariz curto, olhos pequenos, boca pequena e dentes claros. Observa-se que os fatores morfológicos de Maria da Mata são característicos da raça negra.

Maria da Mata se casou com um negro, com quem teve duas filhas e um filho, o filho faleceu após o nascimento. Conta-se que no segundo casamento, devido alguns desentendimentos na cidade, a família fugiu de Bom Jesus de Itabapoana para Ibitirama, onde moraram por um tempo antes da chegada em Iúna por volta de 1940.

João Moreira Sobrinho, o segundo marido de Maria da Mata, tinha dois filhos, um menino chamado Gabriel Moreira Sobrinho que o acompanhou, e outro filho que se casou com Ivail Firmino, a filha mais velha de Maria da Mata, que ficaram morando em Bom Jesus de Itabapoana. A outra filha de Maria da Mata, Abigail Firmino, na época com cinco anos de idade, acompanhou a mãe e o padrasto, conhecido como um homem muito bravo. Por muitos anos trabalharam em um sítio na Mata da Onça, propriedade do Sr. Manoel Moraes. Maria Tereza Firmino, morando na Mata da Onça, passou a ser conhecida por Maria da Mata,

A filha de Maria da Mata, Abigail, aos sete anos de idade, foi morar na casa dos patrões de sua mãe em Iúna. Na casa Abigail cresceu aos cuidados de Dona Helena Vieira Moraes, esposa do Sr. Manoel Moraes, com quem aprendeu a falar, a se vestir e a realizar as atividades domésticas. Lá viveu por muitos anos ajudando a cuidar das crianças do casal, como era de costume naquela época.  Dona Abigail hoje, com aproximadamente 80 anos, vive no Quilombo, tem seis filhos, que já se casaram e moram em Iúna ou nas redondezas. Os netos de Maria da Mata, filhos da Dona Abigail são: Maria Judite Firmino, João Gabriel Firmino (falecido), Zilda Ivanete Firmino, Geilci Firmino, Gecilda Rosa Firmino, Neuseli de Jesus (filha adotiva).

Devido ao falecimento de seu companheiro, Maria da Mata decidiu mudar do sitio, pois era difícil viver sozinha na Mata da Onça, o sítio ficava muito distante da cidade, só era possível chegar no lombo de um burro ou a pé, também  corria o risco de ser atacado pelas onças da mata.

Ao sair da Mata da Onça, trabalhou em outro sitio e depois se mudou para o local que hoje corresponde ao Quilombo, na Rua que recebeu seu nome: Maria da Mata. Na década de 50 o bairro era pouco habitado, os moradores se resumiam entre outros a família do Zé Satírio e a Maria da Mata.

Ela ficou conhecida na cidade como rezadeira ou benzedeira, era muito procurada pelas famílias para socorrer em diversas ocasiões cotidianas as doenças que acometiam, pois os tratamentos médicos convencionais eram escassos. Rezava quebranto, olhado, espinhela caída e outros incômodos das crianças e dos adultos. Com certeza a prática de rezadeira foi uma herança de seus ancestrais negros, pois a participação das tradições africanas é marcante nas rezas. Muitas mulheres da época,  excluídas da sociedade e do mercado de trabalho, tinham este ofício como um meio de integração social.

Na atualidade, as rezadeiras ou benzedeiras, acionam conjuntamente as tradições africanas aos conhecimentos do catolicismo popular, com o objetivo de restabelecer o equilíbrio material ou físico e espiritual das pessoas que buscam a sua ajuda. Para compor este ritual, as rezadeiras utilizam vários elementos acessórios, dentre eles: ramos verdes, gestos em cruz feitos com a mão direita, agulha, linha e pano, além do conjunto de rezas. São mulheres integrantes das camadas populares, geralmente mulheres negras.

As rezadeiras dizem: “É Deus que cura, não podemos cobrar”, um exemplo de benzimento para mau jeito:
Te curo de carne quebrada, torna te a soldar./
Nervo torto torna a seu lugar./
Nervo que retorceste, Deus que te põe onde nasceste./
Eu que te benzo. Deus que te sare./
Onde eu ponho as minhas mãos, Nossa Senhora dá santidade./
Deus queira curar esta quebradura,/
esta rendidura que esse pobre enfermo tem./
Seja pelo amor de Deus, seja tudo. Amém.//
(Ribeirão Preto.SP.1994) 
Maria da Mata passava o dia andando pelas ruas, rezando a quem lhe pedisse. Seus pés grandes estavam sempre descalços, usava saia e blusa com costura bem simples, roupas que ganhava dos conhecidos, medalhas religiosas penduradas no pescoço, fumava cachimbo e cigarro de palha, seus cabelos brancos estavam sempre descabelados, a sua casa tinha apenas um cômodo com piso de chão batido, onde ela criava porquinhos da índia, coelhos e outros bichos, gostava de freqüentar as festas do boi pintadinho do prefeito Romeu Rios.

Tinha o hábito de fazer visitas aos moradores da cidade. Um dia, numa visita na residência do Sr. José Florindo Sobrinho, Maria da Mata disse que gostaria de ser fotografada, então o Sr. José Florindo chamou o fotógrafo da cidade Zé do Bico para fazer o trabalho. A foto está publicada no artigo.

Maria da Mata faleceu em 02/08/1982, seu corpo foi velado na Igreja Católica Matriz de Iúna e sepultado no cemitério municipal.


Pesquisa e texto: Viná Garcia Silveira de Moraes
Professora-historiadora
04/11/2011


Poesias produzidas pelos alunos da EEEFM Henrique Coutinho, com a minha orientação e coordenação, para o Projeto Maria da Mata, em 2011.

Maria da Mata

Maria da Mata
Guerreira Purí
Que veio de Itabapoana
Deixou sua marca por aqui.

Uma pessoa humilde
Com grandes talentos
Rezava e benzia
Todos os tormentos.

Era uma pessoa simples
Mas de bom coração
Tinha muita determinação.
Com garra e amor                           Protegia sua cor.
Lutou e venceu
Mas infelizmente morreu
Deixando saudades
Aos amigos que conheceu.

Autoria: Ângela Ferreira Dutra, Aldenise Batista da Silva                                                                                                                                                                                                                              Turma: 1° 05
                                                                                        Turno: Matutino





Maria da Mata
Pobre mulata nascida na mata
Com sangue de índio
E no coração a raça.
A raça de quem sofreu
A raça de quem conquistou.

Pelos cantos andava
Simples mulata
Por todos desejava
A melhora da desgraça.


Uma família criada e ensinada
Por quem conhece a vida
Para quem ainda vai saboreá-la

A morte a levou
Mas sua sabedoria deixou
Na história marcada
Iúna, Maria da Mata.

Autoria: Gustavo Bello                                                                                                                                                                                                                             Turma: 1°02          Turno: Matutino 


                                                                                                                                                                               
Maria da Mata
Maria da Mata
Mulher da natureza
Mesmo com sua pobreza vivia sem nenhuma tristeza.

Mulher que muito trabalhava
Para manter sua família
Mulher que muito lutava
É a tal Dona Maria.


Vivendo com toda simplicidade
Ficou conhecida
Por viver mais de cem anos
Nessa linda e bela cidade.


História muito marcante.
Dona Maria habitante
De uma cidade muito interessante
                                                                                          Faz aqui seu errante.                                                                                                       
Autoria: Bruno Vieira de Oliveira                                                                                                                                                                                                                       Turma: 1°01              Turno: Matutino




Maria da Mata

Maria da Mata
Descendente de negro e Purí
Morava no Satírio
Onde era muito feliz.


Uma mulher que viveu
Em condições de pobreza,
Mas tinha em seu rosto
Uma enorme franqueza.


Maria da Mata
Era filha de uma índia Purí
Seu pai era escravo
Ela veio morar aqui.


Uma mulher guerreira
De bom coração
Todos que olhavam para ela
Sentiam uma imensa emoção.


Ela faleceu,
E deixou saudades
Pois vivia
Regida com muita dignidade.

Autoria: Aline Goulart da Silva, Andréia de Souza lima e Estefani Miriã Borges                                                                                                                                                                                                         Turma: 1°05       Turno: Matutino




Maria da Mata

Maria da Mata
Mulher vivida
Mulher negra.
Maria da Mata
Mulher da pobreza
Mulher de raça e de cor.
Maria da Mata
Mudou-se para perto
Em Ibitirama
Com sua família
Criou seu teto.

Maria da Mata
Mudou-se para “cá”
E no Satírio
Se pois a morar.


Maria da mata
Na mata viveu
Com seu marido
Que logo faleceu.

Mulher guerreira
Mulher da mata
Mulher de raça
Mulher de cor.

Autoria: Luana Aparecida R. Mariano                                                                                                                                                                                                          
Turma: 1°02           Turno: Matutino



Maria da Mata
O dia da consciência negra se aproxima
E eu irei falar de uma mulher
 Muito amada
Conhecida no município inteiro
Cujo nome era Maria da Mata.

Filha de pai escravo
Que tinha uma vida triste
Mais por um momento
Teve sorte na vida

Ela nasceu após
A Lei do Ventre Livre.
Mulher que trabalhava
Mulher que lutava
Mostrando a todos
A honra da tua raça.

Tendo tudo contra ela
O desrespeito e o preconceito
Mais a eles não se entregava
Pois tinha Deus em seu peito.

Autoria: João Bezerra de Aquino Neto e Everton de Oliveira Silva
Turma: 1°01     Turno: Matutino


Maria da Mata
Mulher negra
De grande sofrimento
Uma vida atribulada
Cheia de tormentos.


Filha de escravo
Com índia Purí
Nasceu em Bom Jesus
E veio morar aqui.


Foi conhecida em toda cidade
Por ser uma benzedeira
Fazia rituais como curandeira.



Vivia pelas ruas
Feliz a cantar
Chegando à casa dos outros
Com o intuito de ajudar.

Autoria: Bruna Barbosa Comam e Lilian Renata de Oliveira Andrade
Turma: 1°02           Turno: Matutino


Maria da Mata
Maria, que se diz da mata,
Que um dia, sob um luar de prata
Se sentiu índia nativamente;
Mulher secular e desprotegida,
Que nasceu para uma longa vida
Ante as curtas vidas da gente.
Maria, eternamente, Maria
Luz do Sol, que ao meio dia
Se fez mais forte no espaço;
Escrava liberta das dores,
Mulher de mortais amores, descorrentada dos braços.

Maria de chorados prantos,
Seus donos crueis foram tantos,
Mas só você permaneceu;
Se mataram por essas terras
E, sem nunca pensar em guerras,
Você, mulher, sobreviveu.
Autor: Vilson Souza Lima
Anuário de poetas do Brasil, 3° volume
Organização de Aparício Fernandes
FOLHA CARIOCA EDITORA LTDA.
1982, Rio de Janeiro



Vilson Souza Lima
Nasceu na cidade de Iúna, Estado do Espírito Santo, no dia 16 de março de 1961.
Filho de Neus Nunes de Lima e Lilia de Souza Lima nascidos na mesma cidade.                                                                                                                                               
Estudou no colégio Polivalente, hoje Escola “Dr. Nagem Abikahir” e na Escola Henrique Coutinho, onde se formou em contabilidade.
Em 1977, ganhou o 1° concurso de redação de Iúna, que teve o tema “Ser Brasileiro”, promovido pelo Lions clube e pelo Banco do Brasil da cidade.
Em 1981, participou do “Anuário de poetas do Brasil”, dando título ao seu conjunto de poesias saudando a sua cidade, “Iúna, nascente dos meus versos”.                                                                                                                                                                          
Sua poesia abriga uma natureza realista sem abstrações, onde seu sentimento busca a verdade natural de cada fonte inspiratória. Com um estilo livre das exigências formais.
 





                                                                                                                                                                                                                                                         







Um comentário:

  1. Parabéns pelo lindo trabalho de pesquisa.
    Sim eu conheci dona Maria da Mata não só ela mais toda família.

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