Personagem histórica do município de Iúna, conhecida por ter vivido mais de um século, Maria da Mata foi uma das primeiras moradoras do Satírio.
Uma mulher que viveu em condições de pobreza, num tempo em que a raça, a cor da pele e o gênero, eram fatores que determinavam à posição social e a vida do indivíduo, onde raramente a ascensão social acontecia. Vivendo na simplicidade e nas condições pertinentes da sua época, Maria da Mata traçou uma história, que circunda desde a marginalidade social de uma mulher afro-descendente a preservação cultural dos costumes indígenas e africanos. Hoje, essa história de vida é contada por depoimentos orais de parentes e conhecidos, tendo como cenário principal a cidade de Iúna no século XX, década de 40 a 1982.
Maria da Mata morava em Bom Jesus de Itabapoana, quando criança viveu numa grande fazenda da região onde seu pai trabalhou como escravo, porém, ela não foi escrava, nasceu após a Lei do Ventre Livre, lei nº2040, aprovada pelo Senado em 28 de setembro de 1871, que concedeu liberdade aos escravos nascidos no Brasil após a data de promulgação da mesma. Os descendentes de Maria da Mata contam que ela era filha de um negro escravo e de uma índia puri, não foram localizados seus registros de nascimento e óbito.
Os Puris, grupo indígena atualmente considerado extinto, habitavam no século XIX os estados brasileiros do Espírito Santo, Rio de Janeiro e Sudeste de Minas Gerais. Devido à chegada dos portugueses, os puris se dispersaram pelo interior do Brasil. Estes indígenas são mencionados com os seguintes aspectos físicos: baixos ou de estatura mediana, robustos, pescoço curto e grosso, pés largos e dedos grandes, pele macia de cor parda-escura, cabelo comprido liso de cor negra, sem cabelo nas axilas e peito, rosto largo, testa estreita, nariz curto, olhos pequenos, boca pequena e dentes claros. Observa-se que os fatores morfológicos de Maria da Mata são característicos da raça negra.
Maria da Mata se casou com um negro, com quem teve duas filhas e um filho, o filho faleceu após o nascimento. Conta-se que no segundo casamento, devido alguns desentendimentos na cidade, a família fugiu de Bom Jesus de Itabapoana para Ibitirama, onde moraram por um tempo antes da chegada em Iúna por volta de 1940.
João Moreira Sobrinho, o segundo marido de Maria da Mata, tinha dois filhos, um menino chamado Gabriel Moreira Sobrinho que o acompanhou, e outro filho que se casou com Ivail Firmino, a filha mais velha de Maria da Mata, que ficaram morando em Bom Jesus de Itabapoana. A outra filha de Maria da Mata, Abigail Firmino, na época com cinco anos de idade, acompanhou a mãe e o padrasto, conhecido como um homem muito bravo. Por muitos anos trabalharam em um sítio na Mata da Onça, propriedade do Sr. Manoel Moraes. Maria Tereza Firmino, morando na Mata da Onça, passou a ser conhecida por Maria da Mata,
A filha de Maria da Mata, Abigail, aos sete anos de idade, foi morar na casa dos patrões de sua mãe em Iúna. Na casa Abigail cresceu aos cuidados de Dona Helena Vieira Moraes, esposa do Sr. Manoel Moraes, com quem aprendeu a falar, a se vestir e a realizar as atividades domésticas. Lá viveu por muitos anos ajudando a cuidar das crianças do casal, como era de costume naquela época. Dona Abigail hoje, com aproximadamente 80 anos, vive no Quilombo, tem seis filhos, que já se casaram e moram em Iúna ou nas redondezas. Os netos de Maria da Mata, filhos da Dona Abigail são: Maria Judite Firmino, João Gabriel Firmino (falecido), Zilda Ivanete Firmino, Geilci Firmino, Gecilda Rosa Firmino, Neuseli de Jesus (filha adotiva).
Devido ao falecimento de seu companheiro, Maria da Mata decidiu mudar do sitio, pois era difícil viver sozinha na Mata da Onça, o sítio ficava muito distante da cidade, só era possível chegar no lombo de um burro ou a pé, também corria o risco de ser atacado pelas onças da mata.
Ao sair da Mata da Onça, trabalhou em outro sitio e depois se mudou para o local que hoje corresponde ao Quilombo, na Rua que recebeu seu nome: Maria da Mata. Na década de 50 o bairro era pouco habitado, os moradores se resumiam entre outros a família do Zé Satírio e a Maria da Mata.
Ela ficou conhecida na cidade como rezadeira ou benzedeira, era muito procurada pelas famílias para socorrer em diversas ocasiões cotidianas as doenças que acometiam, pois os tratamentos médicos convencionais eram escassos. Rezava quebranto, olhado, espinhela caída e outros incômodos das crianças e dos adultos. Com certeza a prática de rezadeira foi uma herança de seus ancestrais negros, pois a participação das tradições africanas é marcante nas rezas. Muitas mulheres da época, excluídas da sociedade e do mercado de trabalho, tinham este ofício como um meio de integração social.
Na atualidade, as rezadeiras ou benzedeiras, acionam conjuntamente as tradições africanas aos conhecimentos do catolicismo popular, com o objetivo de restabelecer o equilíbrio material ou físico e espiritual das pessoas que buscam a sua ajuda. Para compor este ritual, as rezadeiras utilizam vários elementos acessórios, dentre eles: ramos verdes, gestos em cruz feitos com a mão direita, agulha, linha e pano, além do conjunto de rezas. São mulheres integrantes das camadas populares, geralmente mulheres negras.
As rezadeiras dizem: “É Deus que cura, não podemos cobrar”, um exemplo de benzimento para mau jeito:
Te curo de carne quebrada, torna te a soldar./
Nervo torto torna a seu lugar./
Nervo que retorceste, Deus que te põe onde nasceste./
Eu que te benzo. Deus que te sare./
Onde eu ponho as minhas mãos, Nossa Senhora dá santidade./
Deus queira curar esta quebradura,/
esta rendidura que esse pobre enfermo tem./
Seja pelo amor de Deus, seja tudo. Amém.//
(Ribeirão Preto.SP.1994)
Maria da Mata passava o dia andando pelas ruas, rezando a quem lhe pedisse. Seus pés grandes estavam sempre descalços, usava saia e blusa com costura bem simples, roupas que ganhava dos conhecidos, medalhas religiosas penduradas no pescoço, fumava cachimbo e cigarro de palha, seus cabelos brancos estavam sempre descabelados, a sua casa tinha apenas um cômodo com piso de chão batido, onde ela criava porquinhos da índia, coelhos e outros bichos, gostava de freqüentar as festas do boi pintadinho do prefeito Romeu Rios.
Tinha o hábito de fazer visitas aos moradores da cidade. Um dia, numa visita na residência do Sr. José Florindo Sobrinho, Maria da Mata disse que gostaria de ser fotografada, então o Sr. José Florindo chamou o fotógrafo da cidade Zé do Bico para fazer o trabalho. A foto está publicada no artigo.
Maria da Mata faleceu em 02/08/1982, seu corpo foi velado na Igreja Católica Matriz de Iúna e sepultado no cemitério municipal.
Pesquisa e texto: Viná Garcia Silveira de Moraes
Professora-historiadora
04/11/2011
Poesias produzidas pelos alunos da EEEFM Henrique Coutinho, com a minha orientação e coordenação, para o Projeto Maria da Mata, em 2011.
Maria da Mata
Maria da Mata
Guerreira Purí
Que veio de Itabapoana
Deixou sua marca por aqui.
Uma pessoa humilde
Com grandes talentos
Rezava e benzia
Todos os tormentos.
Era uma pessoa simples
Mas de bom coração
Tinha muita determinação.
Com garra e amor Protegia sua cor.
Lutou e venceu
Mas infelizmente morreu
Deixando saudades
Aos amigos que conheceu.
Autoria: Ângela Ferreira Dutra, Aldenise Batista da
Silva
Turma:
1° 05
Turno: Matutino
Maria da Mata
Pobre
mulata nascida na mata
Com
sangue de índio
E no
coração a raça.
A raça
de quem sofreu
A raça
de quem conquistou.
Pelos
cantos andava
Simples
mulata
Por
todos desejava
A
melhora da desgraça.
Uma
família criada e ensinada
Por quem
conhece a vida
Para
quem ainda vai saboreá-la
A morte
a levou
Mas sua
sabedoria deixou
Na
história marcada
Iúna,
Maria da Mata.
Autoria: Gustavo
Bello
Turma:
1°02 Turno: Matutino
Maria da
Mata
Maria da
Mata
Mulher
da natureza
Mesmo
com sua pobreza vivia sem nenhuma tristeza.
Mulher
que muito trabalhava
Para
manter sua família
Mulher
que muito lutava
É a tal
Dona Maria.
Vivendo
com toda simplicidade
Ficou
conhecida
Por
viver mais de cem anos
Nessa
linda e bela cidade.
História
muito marcante.
Dona
Maria habitante
De uma
cidade muito interessante
Faz aqui
seu errante.
Autoria: Bruno Vieira de
Oliveira Turma:
1°01 Turno: Matutino
Maria da
Mata
Maria da
Mata
Descendente
de negro e Purí
Morava
no Satírio
Onde era
muito feliz.
Uma
mulher que viveu
Em
condições de pobreza,
Mas
tinha em seu rosto
Uma
enorme franqueza.
Maria da
Mata
Era
filha de uma índia Purí
Seu pai
era escravo
Ela veio
morar aqui.
Uma
mulher guerreira
De bom
coração
Todos
que olhavam para ela
Sentiam
uma imensa emoção.
Ela
faleceu,
E deixou
saudades
Pois
vivia
Regida
com muita dignidade.
Autoria: Aline Goulart da
Silva, Andréia de Souza lima e Estefani Miriã Borges
Turma:
1°05 Turno: Matutino
Maria da
Mata
Maria da
Mata
Mulher
vivida
Mulher
negra.
Maria da
Mata
Mulher
da pobreza
Mulher
de raça e de cor.
Maria da
Mata
Mudou-se
para perto
Em
Ibitirama
Com sua
família
Criou
seu teto.
Maria da
Mata
Mudou-se
para “cá”
E no
Satírio
Se pois
a morar.
Maria da
mata
Na mata
viveu
Com seu
marido
Que logo
faleceu.
Mulher
guerreira
Mulher
da mata
Mulher
de raça
Mulher
de cor.
Autoria: Luana Aparecida R. Mariano
Turma: 1°02 Turno: Matutino
Maria da
Mata
O dia da
consciência negra se aproxima
E eu
irei falar de uma mulher
Muito amada
Conhecida
no município inteiro
Cujo
nome era Maria da Mata.
Filha de
pai escravo
Que
tinha uma vida triste
Mais por
um momento
Teve
sorte na vida
Ela
nasceu após
A Lei do
Ventre Livre.
Mulher
que trabalhava
Mulher
que lutava
Mostrando
a todos
A honra
da tua raça.
Tendo
tudo contra ela
O
desrespeito e o preconceito
Mais a
eles não se entregava
Pois
tinha Deus em seu peito.
Autoria:
João Bezerra de Aquino Neto e Everton de Oliveira Silva
Turma: 1°01 Turno: Matutino
Maria da
Mata
Mulher
negra
De
grande sofrimento
Uma vida
atribulada
Cheia de
tormentos.
Filha de
escravo
Com
índia Purí
Nasceu
em Bom Jesus
E veio
morar aqui.
Foi
conhecida em toda cidade
Por ser uma
benzedeira
Fazia
rituais como curandeira.
Vivia
pelas ruas
Feliz a
cantar
Chegando
à casa dos outros
Com o
intuito de ajudar.
Autoria: Bruna Barbosa
Comam e Lilian Renata de Oliveira Andrade
Turma: 1°02 Turno: Matutino
Maria da
Mata
Maria,
que se diz da mata,
Que um
dia, sob um luar de prata
Se
sentiu índia nativamente;
Mulher
secular e desprotegida,
Que
nasceu para uma longa vida
Ante as
curtas vidas da gente.
Maria,
eternamente, Maria
Luz do
Sol, que ao meio dia
Se fez
mais forte no espaço;
Escrava
liberta das dores,
Mulher
de mortais amores, descorrentada dos braços.
Maria de
chorados prantos,
Seus
donos crueis foram tantos,
Mas só
você permaneceu;
Se
mataram por essas terras
E, sem
nunca pensar em guerras,
Você,
mulher, sobreviveu.
Autor: Vilson Souza Lima
Anuário de poetas do
Brasil, 3° volume
Organização de Aparício
Fernandes
FOLHA CARIOCA EDITORA
LTDA.
1982, Rio de Janeiro
Vilson
Souza Lima
Nasceu na cidade de Iúna, Estado do Espírito Santo, no dia
16 de março de 1961.
Filho de Neus Nunes de Lima e Lilia de Souza Lima nascidos
na mesma cidade.
Estudou no colégio Polivalente, hoje Escola “Dr. Nagem
Abikahir” e na Escola Henrique Coutinho, onde se formou em contabilidade.
Em 1977, ganhou o 1° concurso de redação de Iúna, que teve o
tema “Ser Brasileiro”, promovido pelo Lions clube e pelo Banco do Brasil da
cidade.
Em 1981, participou do “Anuário de poetas do Brasil”, dando
título ao seu conjunto de poesias saudando a sua cidade, “Iúna, nascente dos
meus versos”.
Sua poesia abriga uma natureza realista sem abstrações, onde
seu sentimento busca a verdade natural de cada fonte inspiratória. Com um
estilo livre das exigências formais.